Autor: John Horvat II
Tradução: André Carezia
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A música ‘Noite Feliz’ é, de longe, a mais simbólica das cantigas de Natal. É compreensível, assim, que fiquemos a refletir sobre a origem de canção tão extraordinária. Para contar a história de suas origens, precisamos voltar à côrte de Frederico Guilherme da Prússia, o quarto rei com esse nome, logo após sua ascensão ao trono em 1840.
Era véspera de Natal. Em Berlim, o rei e seus cortesãos comemoravam o nascimento de Cristo. O coro da catedral, regido por Felix Mendelsohn, executava uma das peças de seu repertório. A música era ‘Noite Feliz’. O rei ficou bem impressionado pela bela canção e imaginou quem seria o autor. Examinou o programa com a lista de hinos sendo cantados e ficou surpreso ao saber que o autor era desconhecido. O rei da Prússia não podia permitir tal imprecisão.
Imediatamente, assim, após a cerimônia, ele fez o maestro vir vê-lo. Mendelsohn, porém, não foi capaz de iluminar em nada o assunto. Ele então chamou o chefe dos concertos reais, Ludovico, cuja reputação era a de descobridor da origem de canções desconhecidas. Mas, para frustração de Frederico Guilherme, ele também não sabia de nada. O rei então ordenou que Ludovico se virasse para descobrir, porque os livros de hinos da Prússia não podiam ficar em desordem!
Agora que a sua reputação estava em jogo, Ludovico não tinha escolha senão descobrir quem era o compositor da canção. Escarafunchou as bibliotecas, cidades, principados e reinos daquelas terras que eram a Alemanha de então. Nada encontrou, porém.
Já tinham começado a chamar Ludovico de ‘o caçador de canções’, quando ele reparou no estilo da música, que parecia austríaca. Foi para Viena, mas novamente deu com os burros n’água. Então um velho músico dos tempos de Haydn lhe deu uma dica. Michael Haydn, o irmão do músico famoso, compôs muitas obras que se tinham perdido. “Talvez essa canção de Natal seja uma daquelas?” sugeriu o velho. Era um tiro no escuro, e Ludovico não se sentiu encorajado pela dica. Desistiu da busca e decidiu retornar à côrte.
Na viagem de volta, enquanto descansava em uma hospedaria, ouviu um passarinho em uma gaiola a cantar uma música familiar. Deu um pulo de tão surpreso. Ludovico percebeu que o pássaro cantava aquela música de Natal misteriosa cujo autor ele procurava; estava cantando ‘Noite Feliz!’
“Que foi?” perguntou o estalajadeiro.
“Este pássaro,” respondeu Ludovico. “Quem ensinou esta canção ao pássaro?”
O estalajadeiro não sabia. Mas acrescentou que um amigo tinha comprado o bicho na abadia de Salzburgo, e deixado ali na pousada para diversão dos hóspedes.
A Abadia de Salzburgo! Ludovico se sentiu de repente como aquele caçador que, depois de muitas buscas infrutíferas, encontra alguns rastros frescos na neve. A pista tinha esquentado de novo! Ele sabia que Michael Haydn tinha morado naquela abadia por muitos anos. Era quase certo que a canção era de Michael Haydn. Ludovico não perdeu tempo: mudou os planos de viagem e partiu para a abadia.
Quando chegou, o chefe dos concertos reais da côrte prussiana foi recebido com todas as honrarias que seu posto merecia. O abade e os monges lhe ofereceram um bom jantar e confortáveis acomodações. Infelizmente, porém, ninguém sabia de onde a canção tinha vindo. Também não acreditavam que o autor fosse Michael Haydn.
Quando o ‘caçador de canções’ lhes contou a respeito do pássaro na gaiola, sugerindo que os monges tinham-lhe ensinado a cantar a música, o abade se mostrou ofendido, já que tais caprichos eram proibidos no mosteiro.
Ludovico examinou, então, todos os manuscritos que havia na cela onde Michael Haydn antigamente trabalhara. E, exatamente como os monges haviam previsto, não encontrou nada. A pista tinha esfriado de novo. Desanimado, Ludovico decidiu retomar sua jornada de volta à côrte prussiana.
Entretanto, por acaso, dentre aqueles que estavam presentes ao jantar oferecido pelo abade, havia um professor chamado Ambrósio Prestainer, que ficou particularmente interessado na estória do pássaro.
“Isto pode ser obra de algum dos meninos do coral da abadia”, matutou ele.
Então, já que o professor conseguia imitar com perfeição o passarinho, ele decidiu tentar um truque para ver se descobria quem havia ensinado esta canção ao animal. Alguns dias depois, ele se ajeitou em uma janela que dava para o pátio interno da escola. E assobiou, imitando o pássaro a cantar ‘Noite Feliz’.
O ardil deu certo, pois logo ele ouviu a voz de um menino: “Ah, passarinho, você voltou!” E um garoto de nove anos de idade veio correndo, saindo da aula. Mas quão surpreso o menino ficou ao ver que tinha caído em uma armadilha!
“Como se chama?”, perguntou o professor.
“Felix Gruber,” respondeu o garoto.
“Muito bem. Diga-me, Felix: onde você aprendeu essa música?”
“Meu pai me ensinou.”
“E de onde ele a tirou?”
“Ele a compôs, senhor.”
Prestainer, sem perder um minuto, foi até a casa do menino em uma vila próxima. Lá ele conheceu o professor de uma escola local, Franz Gruber, que confirmou ter de fato composto a música. Mas a letra, ele disse, tinha sido escrita pelo seu amigo Josef Mohr, que fora pároco na vila de Bagran, e que tinha morrido não fazia muito tempo.
Mal podendo conter a alegria por finalmente ter achado a origem da canção, Prestainer escreveu a Ludovico, “O Caçador de Canções”, contando que sua missão de busca das origens da música tinha acabado. Enviou a Ludovico um relato completo de como a canção surgiu. O relato foi assim:
É véspera de Natal, e a torre da pequena igreja da vila domina as casas cobertas pela neve, como uma galinha que protege seus pintinhos. No presbitério, o jovem Padre Josef Mohr, com 26 anos, se prepara para as cerimônias daquela noite relendo o Evangelho, quando uma batida na porta rompe o silêncio. É uma camponesa que pede ao pároco ajuda para um bebê que acabara de nascer.
Sem demora, o padre deixa o conforto da casa e, depois de uma íngreme subida pela montanha, chega a um casebre humilde onde estava a criança recém-nascida. Ao retornar, as estrelas brilham no céu e o branco da neve reflete sua luz.
Ele começa a refletir sobre a cena que acabara de testemunhar. A criança, o casal de camponeses, o casebre, tudo causou-lhe impressão. Lembravam uma outra criança, um outro casal, uma outra moradia rústica em Belém de Judá.
Após a Missa do Galo, o padre Mohr não consegue dormir. Toma uma caneta e uma folha de papel, e começa a escrever um poema que se tornaria a letra da canção ‘Noite Feliz’.
Na manhã seguinte, o Natal de 1818, o piedoso sacerdote vai atrás de um amigo chamado Franz Gruber, então com 31 anos. Depois de ler o poema, Gruber exclama:
“Padre, era exatamente essa a canção de Natal que eu procurava! Louvado seja Deus!” E naquele mesmo dia ele compôs a música que acompanha a letra.
E assim, dessa maneira singela, imitando os acontecimentos de Belém, nasceu a mais popular e bela canção de Natal de todos os tempos.
FIM.
Traduzido do original em inglês, publicado em dezembro/2016 no site http://www.returntoorder.org/